29 maio, 2010

RELAÇÕES HUMANAS E EMERGÊNCIA PESSOAL

I-A FORÇA ESTRUTURANTE DAS RELAÇÕES

Ninguém se pode realizar sozinho, embora os outros não possam substituir-nos na nossa realização pessoal.

Os que caminham ao nosso lado são dons de Deus para nós, pois são mediações fundamentais para nos podermos realizar.

A qualidade das nossas relações está condicionada pela qualidade das relações que os outros tiveram connosco na primeira etapa da vida.

É por isso que o bem-amado está capacitado para amar bem, pois vive intimamente equilibrado.
Isto quer dizer que o bem-amada está mais possibilitado para se realizar como pessoa do que o mal-amado.

A pessoa comunica-se na medida em que se possui. Nessa mesma medida acolhe a comunicação do outro, aceitando-o e facilitando a sua comunicação.

É nesta interacção que a pessoa se vai estruturando e fazendo emergir o seu ser espiritual e capaz de reciprocidade amorosa.

A criança precisa tanto da ternura para se estruturar na sua afectividade como do pão para viver e crescer.

Daí a sua arte para cativar os adultos e obter a ternura fundamental para obter um crescimento psicológico equilibrado.

É através das relações com os outros que a pessoa vai sendo capaz de se possuir, de se conhecer em profundidade e ser capaz de gostar de si.

A pessoa não é capaz de gostar de si antes de alguém a ter valorizado e apreciado. Esta fome de realização e reconhecimento social que leva as pessoas a criar grupos, associações e outros espaços fundamentais para se conhecerem e realizarem.

À medida que a pessoa amadurece socialmente começa a ser capaz de sair de si, para ir ao encontro dos outros e descobrir as suas diferenças e qualidades.

Deste modo cresce em si o sentido da solidariedade, do trabalho em equipa, do companheirismo, da generosidade e a capacidade de ser dom para os demais.

II-CULTIVAR RELAÇÕES COM QUALIDADE

A construção da pessoa é tarefa que dura a vida toda e implica a dinâmica das relações. Só as relações interpessoais de cooperação e aceitação mútua são verdadeiramente humanizantes.

Vivemos num mundo onde se multiplicam enormemente as relações meramente funcionais:
De tipo comercial, marcadas pelo sentido da produção e do consumo.

Infelizmente, as relações de fraternidade não aumentam nesta mesma proporção. Eis a razão de tantos dramas de solidão que se manifestam através de comportamentos estranhos, tais como:
Pessoas a falar sozinhas nas ruas. Fugas no álcool ou na droga.

Fugas no sexo sem qualidade amorosa ou no atordoamento de espectáculos sem qualidade. Tudo isto quer dizer que vivemos uma crise de qualidade nas nossas relações.

A própria família tem enormes dificuldades para realizar a missão de espaço privilegiado para as relações e a comunhão amorosa.

É preocupante o aumento de casos de neuroses e depressões provocados pela solidão e a descompensação afectiva.

As crianças e os jovens não encontram modelos de doação generosa. Os jovens são impiedosamente empurrados para um mundo de concorrência feroz, acabando por truncar a sua capacidade de solidariedade.

Isto é preocupante, pois a pessoa leva consigo o estilo de relações que a modelou no início da sua estruturação pessoal.

Somos seres históricos. Todas as experiências e relações que nos estruturaram formam um entretecido que nos acompanha ao longo da vida.

Na verdade, começámos por ser o que os outros fizeram de nós. Isto quer dizer que a qualidade das relações e experiências primordiais nos possibilitam e condicionam ao longo da vida.
Ao mesmo tempo levam-nos a possibilitar ou condicionar os que se cruzaram connosco na vida.
Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias


23 maio, 2010

FOME DE SER QUE SÓ O AMOR PREENCHE

I - CHAMADOS A RENASCER

Nascemos inacabados. Eis a razão pela qual levamos connosco uma fome imensa de plenitude.

São João diz que o nosso ser interior, por ser espiritual, não nasce dos impulsos da carne, mas da ternura do Espírito Santo (Jo 3, 3-6).

São Paulo diz que o Espírito Santo é o amor de Deus derramado nos nossos corações. Nascemos para entrar na dinâmica da humanização cuja lei é:

“Emergência pessoal mediante relações de amor e convergência para a comunhão universal da Família de Deus.

A emergência pessoal acontece como fortalecimento espiritual e capacidade de interacção amorosa.

O Homem surgiu na História como fruto de uma marcha evolutiva.

Utilizando a imagem bíblica do barro, diríamos que a evolução é o processo do barro a ser moldado, a fim de surgir Adão.

No interior deste barro emerge o interior espiritual da pessoa como o pintainho emerge dentro do ovo.

A plenitude da vida espiritual acontecerá no dia em que o ovo eclodir, a fim de o pintainho nascer para a Comunhão Universal.

Estamos a emergir, pois somos seres em construção.

À medida que emergimos, vamos convergindo para a Família de Deus.


II - NASCEMOS TALHADOS PARA DEUS

Deus é amor, diz a Bíblia (1 Jo 4, 7). Isto significa que fomos criados pelo amor e para o amor.

São João diz que as pessoas que não amam não conhecem a Deus, pois Deus é amor (Jo 4, 16).

O nosso ser espiritual cresce e robustece-se em relações de amor. Renascer significa emergir como vida pessoal livre, consciente, responsável e capaz de amar.

É a este nível que o Homem é realmente imagem de Deus. Na verdade, a Divindade é pessoas e a Humanidade também.

A plenitude da pessoa não está em si, mas na comunhão. Por outras palavras, apenas na reciprocidade amorosa a pessoa encontra a sua plena identidade.

Por outras palavras, fechada em si, a pessoa está em estado de malogro: não se encontra nem se possui plenamente.

Pelo facto de serem pessoas, os seres humanos são proporcionais a Deus. O divino pode interagir com o humano em comunhão humano-divina.

E foi por esta razão que Deus, comunhão familiar de três pessoas, decidiu incorporar-nos a própria Família Divina.

Isto quer dizer que o divino se enxertou no humano para que este seja divinizado.

Graças a Jesus Cristo, já fazemos uma união orgânica com a comunhão familiar da Santíssima Trindade.

Somos seres com identidade histórica. Só podemos acontecer como pessoas na medida em que renascemos. Os seres humanos são o resultado de uma realização histórica.

Por outras palavras, para se dizer, a pessoa tem de contar uma história, pois a sua identidade é histórica.

Na Festa do Reino de Deus, todos dançaremos o ritmo do amor, mas cada qual com o jeito que treinou enquanto esteve na História.

A nossa identidade física é constituída pelas nossas impressões digitais e pelo nosso ADN.

A nossa identidade espiritual, pelo contrário, é constituída pelo nosso jeito de amar e comungar pelos irmãos.

Por outras palavras, o nosso ser espiritual mede-se pela originalidade e densidade das nossas relações de amor.

Na verdade, que a pessoa humana não vale pelo que tem, mas sim pelo que é. À medida que se realiza, a pessoa emerge de modo único, original e irrepetível.

É por esta razão que na comunhão universal do Reino de Deus, ninguém está a mais.
Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias


17 maio, 2010

CHAMADOS A VENCER O PECADO E A MORTE

Pecar é recusar-se a crescer como pessoa através de relações de amor e comunhão.

Só há pecado quando a pessoa tem a possibilidade de dizer sim ao amor e decide dizer não.
Quando peca, a pessoa diz não à sua realização pessoal e condiciona ou bloqueia a realização dos outros.

Por outras palavras, ao pecar, a pessoa inscreve ritmos negativos, isto é, forças de bloqueio no tecido social.

Face à realidade do pecado, a pessoa pode encontrar-se na situação de vítima, ou na situação de culpada.

Encontrar-se na situação de vítima significa que a pessoa sofre as consequências negativas do pecado sem dele ser culpada.

Quantos milhões de crianças, por exemplo, sofrem as terríveis consequências pecado sem dele serem culpadas.

Há pessoas que fazem o mal, mas que na realidade são vítimas do pecado e não pecadoras.

Estão neste caso as multidões de mal amados com distorções psíquicas e comportamentos compulsivos cuja origem está no facto de terem sido mal amados.

O evangelho dá provas de possuir uma grande sabedoria quando nos proíbe de julgar os outros.
Na verdade, nós não temos nas mãos a história das experiências dolorosas e traumatizantes das pessoas.

É verdade que os outros nos capacitam mas também nos condicionam nas possibilidades de amar e fazer o bem.

A lei do amor é esta: ninguém é capaz de amar antes de ter sido amado e o mal amado ama mal, mesmo quando dá o melhor de si.

Do mesmo modo que o amor dos outros nos capacita para amar, as suas recusas de amor, condicionam-nos nas nossas possibilidades de amar.

Na verdade, a pessoa humana começa por ser o que os outros fizeram dela, mas o mais importante é o que ela faz com as possibilidades que recebeu.

O feixe primordial das possibilidades que e dos condicionamentos que nos marcaram formam o leque dos talentos que, logo à partida, fazem da pessoa um ser único, original e irrepetível.

Referindo-se à diversidade dos talentos, Jesus disse que há pessoas que recebem cinco, outras recebem dois, três ou um (cf. Mt 25, 14-30).
Por ser uma oposição ao amor, o pecado mata possíveis de realização tanto no pecador como nas pessoas que são vítimas do pecado.


O Livro do Génesis diz que o pecado de Adão deu como fruto imediato o fratricídio de Caim do qual resultou a morte do seu irmão Abel (Gn 4, 8-16).

Talhado por Deus para criar fraternidade através do amor, o Homem, ao pecar, inicia uma cadeia de fratricídios, opondo-se ao projecto da Família Universal de Deus.

São Paulo diz que Jesus Cristo é o Novo Adão. Tal como pelo pecado de Adão veio o fracasso da morte, a vitória da Vida Eterna veio por Jesus (1 Cor 15, 20-21; Rm 5, 17-19).

Para o pensamento bíblico, a Humanidade forma um todo orgânico da qual foi a sua primeira cabeça.

Quando a cabeça não tem juízo, quem paga é o corpo. Foi por esta razão que o pecado de Adão se difundiu de modo orgânico pelo tecido universal da Humanidade.

Por outras palavras, com o seu pecado, Adão introduziu a Humanidade inteira no caminho do fracasso e do malogro.

O Livro do Génesis diz que Deus expulsou o Adão pecador do Paraíso (Gn 3, 23-24). Foi esta a razão pela qual os seres humanos ficaram sem acesso ao Paraíso.

Jesus veio como o Novo Adão. No momento da sua morte e ressurreição, diz o evangelho de São Lucas, Jesus reabre as portas do Paraíso e a Humanidade entra com ele na plenitude da Vida Eterna.

Eis as palavras que Jesus dirige ao Bom Ladrão no momento da sua morte e ressurreição:

“Em verdade te digo: hoje mesmo estarás comigo no Paraíso” (Lc 23, 43).

Por outras palavras, a ressurreição de Jesus significa a vitória sobre a infidelidade de Adão. No evangelho de São João, Jesus apresenta-se não só como aquele que nos introduziu no caminho que nos conduz a Deus, mas ele mesmo é o caminho:

“Jesus respondeu a Filipe:”Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém pode ir ao Pai, senão por mim” (Jo 14, 6).

Este ensinamento de Jesus é muito importante, pois ensina-nos que é preciso estar unidos de modo orgânico a Jesus para chegarmos à comunhão com o Pai.

Com a sua infidelidade, Adão opôs-se ao plano de Deus, acabando por colocar a Humanidade no caminho da perdição.

Jesus Cristo, pelo contrário, realizou de modo perfeito a vontade do Pai, introduzindo-nos deste modo, no caminho da salvação:

“O meu alimento, diz Jesus no evangelho de São João, é fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra” (Jo 4, 34).

Depois acrescenta: “Eu não procuro a minha vontade, mas a vontade de quem me enviou” (Jo 5, 30).

A atitude de Jesus face a Deus é totalmente oposta à atitude de Adão. O relato do pecado de Adão ensina-nos que todos nós, ainda antes de sermos pecadores, já somos vítimas do pecado.

Isto quer dizer que a vocação básica do ser humano é a sua humanização mediante relações de amor, a fim de atingir a plenitude da comunhão com Deus.

A lei da humanização é esta: “Emergência pessoal mediante relações de amor e convergência para a fraternidade e a comunhão universal”.

Para realizarmos esta meta podemos contar com a presença do Espírito Santo no nosso íntimo que é, como diz São Paulo, o amor de Deus derramado nos nossos corações (Rm 5,5).

Sem amor o coração do ser humano fica árido como um tronco ressequido na vastidão do deserto.

Quando o amor não emerge no coração de uma pessoa, a fonte da alegria seca e o vigor da vida murcha.

Sem amor, a pessoa não se pode estruturar, pois ela foi talhada para o encontro e a comunhão.

O coração é o núcleo mais íntimo do nosso ser espiritual. É o ponto de encontro com Deus e os irmãos.

O nosso coração é o ponto de emergência do qual brotam as decisões que optimizam as nossas relações de amor.

Quando o coração do ser humano está vazio de amor, essa pessoa fica dominada pela solidão, o tormento de não poder possuir-se de modo perfeito, nem poder atingir uma realização plena.

Sem amor, o coração da pessoa é um espaço onde não habita a alegria do face a face e da reciprocidade.

Sem água, as plantas secam e os animais não podem viver. Assim acontece à pessoa que não tem amor no coração.

Com o coração vazio de amor, a pessoa está privada da força necessária para se construir na vida.

Com efeito, as nossas recusas de amor não só impedem a nossa estruturação pessoal, como bloqueiam a realização das pessoas que se cruzam connosco na vida.
Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias


13 maio, 2010

CHAMADOS A REINAR COM CRISTO

Na Carta aos Romanos, São Paulo anuncia de maneira firme que Jesus Cristo é o descendente prometido a David, o qual realizou o de modo fiel e perfeito o plano messiânica sonhado por Deus:

“Ele é filho de David segundo a carne (Rm 1, 3). Depois acrescenta: “Foi constituído Filho de Deus, isto é, rei glorioso, no momento da sua ressurreição de entre os mortos (Rm 1,4-5).

É um rei que não se impõe pela força e em cujo reino apenas existe um mandamento, como Jesus declara no evangelho de São João:

“Dou-vos um mandamento novo:”Amai-vos uns aos outros como eu vos amei.” As pessoas saberão que sois meus discípulos se vos amardes uns aos outros” (Jo 13, 34-35).

Na verdade, o amor propõe-se, nunca se impõe. O amor é uma dinâmica de bem-querer que tem como origem a pessoa e como meta a comunhão.

A Primeira Carta de São Pedro diz a realeza de Jesus assenta sobre um povo de reis.

Por outras palavras, Por ser a Cabeça da Nova Humanidade, Jesus partilhou a sua realeza connosco, fazendo de nós membros do seu Corpo:

Eis as palavras de São Paulo a este propósito: “Vós sois o Corpo de Cristo e seus membros, cada um na parte que lhe toca” (Rm 12, 27).

E a Primeira Carta de São Pedro acrescenta: “Vós, porém, sois um povo escolhido, sacerdócio santo, povo de reis, povo reunido e adquirido, a fim de proclamardes as maravilhas do Deus que vos chamou das trevas para a sua luz admirável” (1 ped 2, 9).

O Reino de Cristo, portanto, é um povo de reis. É por esta razão que, neste reino só existe um mandamento:

“O meu mandamento é este: que vos ameis uns aos outros como eu vos amei. Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos” (Jo 15, 12-13).

Quando a poder de um reino assenta no amor, todos reinam, pois o amor é comunhão e partilha.

Antes de morrer, Jesus dizia que o Reino de Deus estava no meio das pessoas (Lc 17, 21).
Na verdade, durante a vida do Jesus histórico, o reino de Deus isto é, a união orgânica do humano com o divino estava a acontecer apenas no interior de Jesus.

Como o reino estava a emergir no interior de Jesus e ele vivia no meio das pessoas, ele afirmava que o Reino estava no meio daaspessoas.

Mas no momento da sua morte e ressurreição, Jesus passou para as coordenadas da equidistância e da interioridade, ficando mais interior a nós que nós próprios.

Ao ressuscitar, Jesus ficou unido de modo orgânico a toda a Humanidade, assumindo-nos no mistério da Família Divina.

A partir deste momento o reino de Deus ficou a habitar no nosso íntimo, do mesmo modo que antes da morte de Jesus só habitava no seu interior.

Com a ressurreição de Jesus o reino de Deus passou para a face interior do Universo. Com efeito, após a sua ressurreição, Jesus vem sempre a nós a partir de dentro e o Espírito Santo optimiza a nossa comunhão com ele no nosso coração, capacitando-nos, deste modo, para reinarmos com ele.

A multidão dos seres humanos que precederam Jesus na História ressuscitaram com ele no momento da sua ressurreição, como diz o evangelho de São Mateus (Mt 27, 52-53).

Do mesmo modo, todos os que viveram antes de nós na História já participam de modo pleno na comunhão Universal do Reino de Deus.

E nós, graças ao facto de estarmos unidos de modo orgânico a Cristo, já estamos unidos a eles. É este o mistério da Comunhão Universal dos Santos.

Por outras palavras, nós e os nossos seres queridos que já participam de modo pleno na face interior da comunhão dos Santos, estão muito próximos de nós, pois já não existe qualquer lonjura a este nível.

Os que habitam de modo definitivo com Cristo a morada de Deus, portanto, habitam a interioridade máxima do Universo.

Com efeito, a morada de Deus é um campo espiritual contínuo de interacções amorosas, o qual constitui a interioridade máxima do Universo.

Isto quer dizer que podemos comungar com as pessoas divinas e as humanas que já habitam a plenitude do Reino de Deus.

É exactamente este o sentido profundo da afirmação de Jesus segundo a qual o Reino de Deus está no nosso íntimo:

“Interrogado pelos fariseus sobre o momento em que chegaria o reino de Deus, Jesus respondeu-lhes: “A vinda do Reino de Deus não é observável.

Não se poderá dizer: “Ei-lo aqui ou acolá”, pois o Reino de Deus está no meio de vós” (Lc 17, 20-21).

Após a ressurreição de Cristo, o reino de Deus torna-se interior a tudo e a todos. Eis as palavras de São Paulo: “Não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós?

Se alguém destrói o templo de Deus, Deus o destruirá, pois o templo de Deus é santo e esse templo sois vós” (1 Cor 3, 16-17).

Na Carta aos Romanos, São Paulo diz que o Espírito Santo é o amor de Deus derramado nos nossos corações (cf. Rm 5, 5). Isto quer dizer que o mistério do amor e da comunhão universal já estão no nosso íntimo.

A Carta aos Gálatas diz que, com Cristo, chegou a plenitude dos tempos. Os tempos anteriores a Cristo foram os tempos da gestação.
Com a Encarnação começou a dinâmica do parto, dando origem ao nascimento dos filhos de Deus:

“Mas quando chegou a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho nascido de uma mulher sujeita ao domínio da Lei de Moisés, a fim de resgatar da servidão da Lei e lhes a adopção de Filhos de Deus.

E porque somos filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho que, nos nossos corações clama: “Abba, papá querido”.

Deste modo já não és escravo, mas filho. E se és filho és também herdeiro pela graça de Deus” (Gal 4, 4-7).

Segundo a Carta aos Romanos, nós somos incorporados na Família de Deus como filhos e herdeiros em relação a Deus Pai e como irmãos e co-herdeiros em relação ao Filho de Deus” (Rm 8, 14-17). É isto que nos capacita para reinarmos com Cristo.

Eis as palavras de São na Carta aos Romanos: “De facto, todos os que são conduzidos pelo Espírito Santo são filhos de Deus.

Vós não recebestes um espírito de escravidão para andardes com medo. Pelo contrário, recebestes um Espírito de adopção que faz de todos nós filhos de Deus e nos faz clamar “Abba”, isto é, Pai Querido!”

É o próprio Espírito Santo que, no nosso íntimo, dá testemunho de que somos realmente filhos de Deus.

Ora, se somos filhos, somos também herdeiros de Deus Pai e co-herdeiros com o Filho de Deus” (Rm 8, 14-17).

Os evangelhos gostam de apresentar o Reino de Deus em forma do grande banquete da Família de Deus.

Isto que dizer que o Reino de Deus é a festa universal do Amor. Nesta festa, todos dançam o ritmo do amor, mas cada qual com o jeito que treinou enquanto viveu na terra.

É magnífico saber que estamos a edificar na História a nossa identidade espiritual e o nosso jeito de participar para sempre na festa do Reino de Deus.
Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias


08 maio, 2010

RENASCER É CONSTRUIR-SE PARA DEUS

Fomos criados para nos criarmos. O ser humano não age de modo consciente no parto através do qual nasce para a sociedade.

É verdade que não fomos os protagonistas do nosso primeiro nascimento, mas somos autores do nosso segundo nascimento em união com o Espírito Santo.

A dinâmica da humanização é, na verdade, o parto através do qual a pessoa vai renascendo, oferecendo a Deus a matéria-prima da divinização.

Por outras palavras, o ser humano será tanto mais divino quanto mais se humanizar. A humanização da pessoa acontece como emergência espiritual mediante relações de amor e convergência espiritual para a Comunhão Universal do Reino de Deus.

Apesar de o Espírito Santo ter um papel central nesta dinâmica da humanização, ele não nos substitui. De facto, Deus está connosco, mas nunca em nosso lugar.

A emergência espiritual acontece como robustez espiritual e capacidade de interagir de modo amoroso com Deus e os irmãos.

Deus não nos criou como seres acabados, a fim de podermos renascer como seres livres, conscientes, responsáveis e capazes de amar.


A matéria-prima de que dispomos para realizar este processo de renascer é o conjunto dos nossos talentos, isto é, as possibilidades de realização que recebemos dos outros.

Renascer é emergir e crescer como pessoas com uma interioridade espiritual, a qual constitui a nossa identidade espiritual.

É verdade que temos a nossa identidade física constituída pelas nossas impressões digitais e o nosso ADN.

Esta identidade não é resultado de uma decisão nossa, pois é resultado dos dons que recebemos dos outros.

Na verdade, começamos por ser o que os outros fizeram de nós. Não escolhemos nada à partida.

Mas para lá da nossa identidade física, temos também a nossa identidade espiritual que consiste no nosso jeito de amar e comungar com Deus e os irmãos.

A nossa identidade física acaba no cemitério. A nossa identidade espiritual, pelo contrário, é a veste nupcial com a qual participaremos para sempre no Reino de Deus.

Podemos dizer que, na festa do Reino de Deus, todos dançam o ritmo do amor, mas cada um com o jeito que foi adquirindo ao longo da sua realização histórica.

Com efeito, a pessoa humana é uma obra-prima feita de barro dentro da qual está a emergir e a robustecer-se outra obra-prima feita de espírito.

Isto quer dizer que o nosso ser espiritual está a emergir no nosso interior como o pintainho vai emergindo dentro do ovo.

Isto significa que nascemos para renascer. À medida que renascemos, emergimos e estruturamo-nos como pessoas únicas, originais, irrepetíveis e capazes de amar.
Somos seres que se vão realizando na história e a meta desta realização é a comunhão universal da Família de Deus.
Somo seres estruturalmente históricos. É por esta razão que as pessoas, para se dizerem, têm de contar uma história.


Nascemos com uma vocação básica, diz Jesus no evangelho de São João: renascer pelo Espírito Santo, a fim de atingirmos a Vida Eterna.

O que nasce da carne é carne e o que nasce do Espírito é espiritual. É por esta razão que temos de renascer pelo Espírito Santo (Jo 3, 6).

Nascemos talhados para amar. Deus capacitou-nos para realizar esta tarefa insuflando o hálito da vida no barro primordial do qual saiu Adão.

Depois, graças ao mistério da Encarnação, a Humanidade ficou unida de modo orgânico à própria divindade através de Jesus Cristo.

À medida que renascemos estamos a caminhar de modo seguro para a plenitude da Família de Deus: Filhos em relação a Deus Pai e irmãos em relação ao Filho de Deus (cf. Gal 4, 4-7).

O Espírito Santo conduz este processo de humanização à plenitude da divinização. São Paulo diz que o Espírito Santo é o Amor de Deus derramado nos nossos corações (Rm 5,5).

Ele é o vínculo maternal de comunhão orgânica que nos une à Comunhão humano-divina do Reino de Deus.

Ele é a força pessoal que dinamiza e optimiza as nossas relações de amor com as pessoas divinas e as pessoas humanas.

Falando da necessidade que temos de renascer, Jesus diz que só podemos tomar parte no Reino de Deus se renascermos pelo Espírito Santo (Jo 3, 3-6).

Criada à imagem de Deus, a pessoa humana está talhada para o dom: Quanto mais se dá mais se possui.

Ao darmos as nossas coisas materiais ficamos sem elas. Com a vida espiritual acontece o contrário: quanto mais nos damos, mais nos possuímos.

Através do amor e do dom de si, a pessoa está chamada a fazer da sua vida uma obra-prima de humanidade.

O Espírito Santo transforma os nossos corações optimizando a nossa capacidade de amar e fazer o bem, a fim de podermos entrar na plenitude das relações do Reino de Deus habitando para sempre nas coordenadas da Comunhão Universal.

A morada de Deus é um campo espiritual contínuo de interacções amorosas que constitui a interioridade máxima do Universo, mas sem se confundir com ele.
Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias


02 maio, 2010

O SOFRIMENTO HUMANO À LUZ DE CRISTO

Jesus declara aos mensageiros enviados por João Baptista que a vontade de Deus é a libertação total das pessoas:

“Os coxos andam, os cegos vêem, os leprosos são curados, os surdos ouvem e os mortos ressuscitam (Mt 11, 4-5).

Jesus veio inaugurar o Reino de Deus em cuja plenitude não terá lugar o sofrimento, a morte, a dor, a tristeza ou a solidão.

No Reino de Deus, o sofrimento e a morte serão totalmente banidos. (Apc, 3-4; Heb 2, 43, 3).

O Antigo Testamento via a questão do sofrimento segundo o esquema: pecado-castigo, justiça-felicidade.

Marcados por esta visão antiga, os discípulos perguntam a Jesus a propósito do cego de nascença:

“Quem pecou ele ou o pai dele?”. (Jo 9, 2). Nem ele nem o pai. As situações de sofrimento são um apelo de Deus a solidarizarmo-nos e comprometermo-nos com os que sofrem (Jo 9, 3-7).


Deus não é o autor do sofrimento. Existe um sofrimento que deriva do próprio facto de a pessoa humana estar em processo de realização.

Mas este sofrimento é tolerável e vantajoso. É o sofrimento dos partos mediante os quais nasce o Homem Novo.

Há também um sofrimento que resulta das limitações da natureza, a qual é frágil e inacabada.

Também este sofrimento é tolerável quando vivido numa dinâmica de solidariedade e partilha.

Mas existe um sofrimento que é intolerável e chocante para a razão humana: Pessoas oprimidas. Crianças maltratadas. Seres humanos a morrer de fome perante a indiferença de povos que vivem esbanjando.

Há tantas fronteiras criadas para impedir a circulação dos bens que esta Terra generosa e fecunda produz para todos.

Seres humanos que asfixiam de solidão. Pessoas idosas abandonadas e sós. Pobres explorados. Sistemas sociais alicerçados na injustiça, marginalizando pessoas.

Doenças provocadas pelo egoísmo humano que está a destruir a natureza. Guerras monstruosas que destroem pessoas e cidades, desencadeadas devido ao egoísmo de meia dúzia de indivíduos desumanos.

Seres humanos privados da sua dignidade e reduzidos a objectos de compra, venda ou meros objectos de prazer sexual.

Além destas, há muitas outras situações de sofrimento intolerável e revoltante. Este sofrimento é obra do egoísmo e das nossas recusas de amor.

Deus vai suscitando profetas que denunciam estas situações de sofrimento e convidam os homens a caminhar segundo o plano de Deus:

Os cristãos estão chamados a ser no mundo uma consciência teologal. A nossa vocação é ler os acontecimentos com os olhos da revelação de Deus, actuando de acordo com os critérios de Jesus.

Deus chama-nos a luta contra o sofrimento dos doentes, dos nus, dos presos, dos doentes e dos oprimidos.
Seremos julgados pelos nossos compromissos neste sentido, diz Jesus no texto do juízo final de São Mateus (Mt 25, 31-46).
Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias