05 junho, 2010

DEUS TALHOU-NOS PARA A LIBERDADE

São Paulo entende a acção libertadora de Cristo como uma capacitação para sermos livres. Eis o que ele diz na Carta aos Coríntios:
“O Senhor ressuscitado é Espírito e onde está o Espírito do Senhor, aí habita a liberdade” (2 Cor 6, 17).

E na Carta aos Gálatas diz que Jesus nos salvou, a fim de sermos livres:

“Foi para a liberdade que Cristo nos salvou. Portanto, permanecei firmes e não vos sujeiteis de novo ao jugo da escravidão” (Gal 5, 1).

Como imagem de Deus que é, a Humanidade é constituída por pessoas. Ora, uma das características fundamentais da pessoa humana é o facto de possuir o livre arbítrio ou seja, a capacidade de se tornar livre.

O livre arbítrio é a capacidade psíquica de optar pelo bem ou pelo mal e, deste modo, poder tornar-se livre.

Na verdade, o ser humano torna-se livre na medida em que rejeita o mal e opta pelo bem.

Pelo facto de ser uma pessoa em construção, o ser humano não nasce acabado. Faz-se, fazendo. Realiza-se, realizando.

Isto quer dizer que Deus quis que o Homem tivesse parte na sua própria realização, a fim de poder construir-se como pessoa livre.

A pessoa humana não pode tornar-se livre sem exercitar o livre arbítrio, optando pelo bem.

Na verdade não basta exercitar o livre arbítrio para que uma pessoa se torne livre, pois este é a capacidade de optar pelo bem ou pelo mal.

Mas a pessoa só chega a ser livre se as suas opções se orientarem na linha do amor. O amor é uma dinâmica de bem-querer que tem como origem a pessoa e como meta a comunhão.

O amor implica eleger o outro como alvo de bem-querer, aceitando-o como é, apesar de ser diferente de nós, e agir de modo a facilitar a sua realização e felicidade.

A liberdade da pessoa em construção vai-se afirmando de modo gradual e progressivo à medida que via estruturando uma cadeia de realizações na linha do amor.

Por outras palavras, pessoa torna-se livre na medida em que se compromete com o processo da humanização.

Isto quer dizer que uma pessoa que nunca se tenha comprometido com as causas do bem nunca chegará a ser livre.

E depois acrescenta: “Por amor fazei-vos servos uns dos outros. Quem ama cumpre plenamente a Lei de Moisés, a qual diz: “Ama o teu próximo como a ti mesmo” (Ga 5, 14).


São Paulo entendeu perfeitamente o modo de agir de Jesus, o qual resumiu as normas, leis e preceitos da Lei de Moisés resumiu num único mandamento:

“Dou-vos um mandamento novo: que vos ameis uns aos outros como eu vos amei” (Jo 13, 34).

Podemos dizer que a liberdade é o resultado de uma vida vivida como processo de libertação.

À medida que vai emergindo, a liberdade capacita a pessoa para se relacionar amorosamente com os outros e interagir criativamente com as coisas e os acontecimentos.

Isto quer dizer que a liberdade é sempre um bem. Já não podemos dizer a mesma coisa do livre arbítrio, pois este pode ser orientado no sentido do bem ou do mal.

O livre arbítrio não é a liberdade, mas apenas a capacidade de a pessoa se tornar livre.

É este o sentido das palavras de Jesus no evangelho de São João: “Quem comete o pecado é escravo” (Jo 8, 34).

Deus é infinitamente livre, mas não tem livre arbítrio, pois as pessoas divinas não estão a realizar-se como seres livres.

Por outras palavras, as pessoas divinas não são liberdades em construção, pois são infinitamente livres.

À medida que se realiza como pessoa, o ser humano emerge como interioridade espiritual livre, consciente, responsável e capaz de comunhão amorosa.

Com efeito, é dos outros que recebemos o leque dos talentos que formam a matéria-prima da nossa realização.

Começámos por ser o que os outros fizeram de nós. Não escolhemos nada: nem a raça, nem a nacionalidade, nem o século em que queríamos viver.

É por esta razão que cada pessoa se realiza de modo único, original e irrepetível. É com estes dados que os seres humanos estão chamados a avançar na marcha da sua humanização cuja lei é:
“Emergência pessoal mediante relações de amor e convergência para a Comunhão Universal”.

É este o sentido das palavras de Jesus no evangelho de São João: “Quem comete o pecado é escravo” (Jo 8, 34).

À luz das Escrituras, o Espírito Santo é o protagonista do processo histórico da libertação humana.

Logo no princípio da Criação, diz o Livro do Génesis, o hálito de Deus, isto é, o Espírito Santo, entrou no interior do Homem e este tornou-se um ser vivente (Gn 2, 7).

Trata-se de uma intervenção especial de Deus que não aconteceu na criação de qualquer animal.

Esta intervenção especial de Deus na criação do Homem significa que o Espírito Santo está sempre presente no nosso íntimo optimizando as nossas capacidades, a fim de darmos frutos de Vida Eterna.

E é assim que o Espírito Santo se torna em nós, e nunca sem nós, o arquitecto da nossa libertação.

É este o sentido das palavras de Jesus quando na sinagoga de Nazaré anunciou que o Espírito Santo o consagrou para a missão de libertar a Humanidade:

“O Espírito do Senhor está sobre mim porque me ungiu para anunciar a Boa Nova aos pobres e a libertação aos cativos” (Lc 4, 18).

As condições sociais, políticas, económicas ou culturais, podem facilitar ou dificultar o crescimento da liberdade humana, mas não são capazes de destruir o que o ser humano já é como pessoa livre.

Na verdade, não é pelo facto de uma pessoa estar na prisão que deixa de ser livre, mas está condicionada nas possibilidades de crescer na sua liberdade.

Na verdade, uma pessoa encerrada num cárcere está limitada nas possibilidades de exercitar o seu livre arbítrio, condição fundamental para continuar a amadurecer na sua liberdade.

Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias