14 setembro, 2009

A PESSOA E A QUALIDADE DO SEU CORAÇÃO-II

II-O CORAÇÃO COMO MORADA DE DEUS

O Livro do Génesis que Deus se debruçou para beijar o barro primordial do qual saiu Adão comunicando-lhe, nesse momento, o hálito da vida (Gn 2, 7).

É isto mesmo que São Paulo quer dizer quando afirma que o Espírito santo é o amor de Deus derramado nos nossos corações (Rm 5, 5).

Isto quer dizer que o Espírito Santo está em nós como uma presença que ilumina, interpela e nos convida a agir na linha do amor, a fim de se realizar como pessoa.

Nas bem-aventuranças, Jesus diz que os puros de coração verão a Deus (Mt 5, 8). Isto significa que o essencial das pessoas se vê com o coração não com os olhos do rosto.

Mas esta declaração pressupõe que o homem é responsável pela qualidade do seu coração. O Deus da revelação bíblica tem coração, pois o coração é o ponto de encontro de uma pessoa com as outras.

A bíblia afirma muitas vezes que Deus tem coração. Se o coração é o núcleo mais nobre do ser humano e o ponto de encontro com as outras pessoas, então temos de reconhecer que as pessoas divinas também têm coração.

Jesus convidou os discípulos a amar ao jeito de Deus, a fim de o seu coração se moldar cada vez mais com o de Deus:

“Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem. Fazendo assim tornar-vos-eis filhos do vosso Pai que está no Céu, pois ele faz com que o sol se levante sobre os bons e os maus e faz cair a chuva sobre os justos e os pecadores” (Mt 5, 44-45).

Entendido como o núcleo espiritual a partir do qual emergem as decisões do ser humano, temos de reconhecer que o coração é uma dimensão essencial da pessoa.

Neste sentido, os animais não têm coração, pois não se constituem como pessoas livres, conscientes e responsáveis.

A Palavra de Deus é acolhida e no coração, pois o coração é o ponto de encontro com Deus e os irmãos.

O evangelho de São Lucas diz que Maria acolhia e meditava a Palavra de Deus e a guardava no seu coração (Lc 2, 51).

Podemos dizer que a comunicação da Palavra de Deus acontece como fruto da interacção entre o coração da pessoa humana e o Espírito Santo.

As pessoas divinas comunicam entre si interagindo de coração a coração. O mesmo acontece com as pessoas humanas quando estas comunicam em profundidade.

Como vemos, Deus não é um ser estático. A Divindade não é uma essência eternamente imutável.

Por outras palavras, graças ao facto de ter coração e ser comunhão, a Divindade é novidade permanente.

No evangelho de São Mateus, Jesus pede aos discípulos para moldarem os seus corações, inspirando-se no próprio coração de Jesus:

“Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração” (Mt 11, 29). Podemos dizer que o coração de Jesus é a fonte do amor e da fidelidade incondicional a Deus.

Foi no coração de Jesus que se deu o encontro do melhor de Deus com o melhor do Homem.
Foi no coração de Jesus que a Palavra das Escrituras teve o seu eco mais profundo.

Isto era essencial, pois foi no coração de Jesus que o Reino de Deus, isto é, a comunhão humano-divina começou a emergir.

Por isso, durante o tempo em que Jesus viveu na história, o Reino de Deus estava a brotar no meio dos homens. Isto quer dizer que Jesus estava no meio dos homens:

“Se é pelo dedo de Deus que eu expulso os demónios, então o Reino de Deus já está no meio de vós” (Mt 12, 28).

Mas no momento da sua morte e ressurreição, o Reino de Deus tornou-se presente às pessoas a partir de dentro.

Pelo acontecimento da sua ressurreição, Jesus entrou nas coordenadas da universalidade, tornando-se interior a tudo e a todos:

“A vinda do Reino de Deus não é observável. Não se poderá dizer ei-lo aqui ou acolá, pois o Reino de Deus está dentro de vós” (Lc 17, 20-21).

Isto significa que foi no coração de Jesus que se fez a assinatura da Nova e Eterna Aliança.

Por parte da Divindade assina o Filho Eterno de Deus. Por parte da Humanidade assina Jesus de Nazaré, o Filho de Maria.

Foi no coração de Jesus que a Humanidade chegou à plenitude dos tempos, isto é, o tempo da gestação chegou à sua plenitude.

Agora começou o parto, o qual dá início ao nascimento dos filhos de Deus, diz a Carta aos Gálatas (cf. 4, 4-7).

Com efeito, a Encarnação aconteceu como enxerto do divino no humano, a fim de este ser divinizado. É aqui que radica o fundamento da Nova e Eterna Aliança.

Foi a partir do coração de Jesus que aconteceu a difusão do Espírito Santo. No momento em que o soldado trespassa com a lança o peito de Jesus, saiu sangue e Água do seu coração, diz o evangelho de São João (Jo 19, 34).

A água é a Água Viva como Jesus tinha explicado. No nosso coração, esta Água Viva dá origem a uma nascente de Vida Eterna (Jo 7, 37-39).

As pessoas que beberem desta Água, disse Jesus à Samaritana, nunca mais terão sede (Jo 4, 14).

Por seu lado, o sangue que sai do lado de Jesus é o sangue da Nova e Eterna Aliança, isto é, o Espírito Santo que é o dinamismo vital de Jesus ressuscitado.

Foi isto que Jesus disse aos judeus quando lhes explicou que a carne e sangue que nos alimenta são a dinâmica amorosa do Espírito Santo e não uma realidade de ordem biológica (Jo 6, 62-63).

Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias

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